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Sem piloto
Meninos, eu vi. A minha geração, que já viu muita coisa, tem todo o direito de dizer-se embasbacada com os tais aviões sem piloto, produzidos em Israel. Trata-se de aviões com sensores, capazes de voar até 15 horas, guiados por controle remoto. Para que servem? Até agora para gravar o que acontece embaixo e filmar no escuro com o uso de um sensor térmico capaz de distinguir entre seres vivos e objetos inanimados.
Para que se tenha idéia da utilidade, os EUA já possuem 6 mil aviões teleguiados que voam nos céus de países como o Iraque e o Afeganistão. Mais: a indústria aeronáutica de alguns países já se prepara para produzir as máquinas voadoras teleguiadas.
Nem é preciso dizer que logo as grandes aves de metal teleguiadas disporão de armamentos o que tornará as missões aéreas em territórios inimigos aquilo que por aqui se considera ”uma baba”. Ei, você, escute: estamos chegando às mortes por agentes impessoais, mortes programadas, processadas e realizadas por máquinas, sem culpa.
Não haverá mais Guernica, a cidade espanhola completamente arrasada, em 1937, em apenas três horas, por bombadeiros Condor, pilotados por alemães. Nem haverá Hiroshima, cidade japonesa onde um piloto norte-americano lançou uma bomba atômica, em 1945. Existirão, sim, regiões bombardeadas por máquinas.
Olho para uma reprodução do quadro Guernica, de Picasso, no qual o pintor concentrou todo o horror da destruição. Penso em qual seria a reação de Picasso, caso a morte de 1645 pessoas em Guernica tivesse sido provocada por máquinas teleguiadas. Dirão, talvez, que no fundo trata-se da mesma coisa, afinal mortes são mortes, não importa quem ou o quê as provoquem. Não sei. A frieza das máquinas, o uso de recursos tecnológicos para exterminar seres humanos a partir de assassinos impessoais porque distantes e talvez desconhecidos, incorpora à realidade de nossos dias a virtualidade dos videogames. Para mim o nome disso é horror, o que me leva ao impossível passo seguinte, o da rebelião das máquinas de voar teleguiadas que, unidas, passam a exterminar o homem em toda a Terra. Impossível?
O Fim do Mundo
Ultimamente os filmes de desenho animado têm apostado numa fórmula curiosa: a da existência de mundos de diferentes tamanhos, desproporcionais. A intenção é óbvia: contrapor a Terra e a humanidade à vastidão do universo, o que nos reduz a um grão de poeira. A partir daí todo o drama humano, a nossa história e as nossas vaidades ficam reduzidas a nada quando se contempla a insignificância da própria Terra diante das estrelas que povoam os confins do universo.
Está rodando na rede Telecine um desses filmes cujo título é “Horton e o mundo dos Quem”. Horton é um alegre elefantinho que descobre haver vida num grão encontrado num trifólio. No pequeno grão vivem os Quem, moradores da cidade chamada Quemlândia. Horton contata o prefeito da cidade e faz de tudo para proteger os Quem. Mas, acreditar na existência de pequenos seres inteligentes, vivendo num grão, cria problemas para Horton que passa a ser tido como louco pelos outros animais. Por outro lado, as coisas não ficam bem em Quenlândia: a população e um conselho de veneráveis não acreditam que vivam num simples grão, afinal Quemlândia é o seu mundo e está por se comemorar o centenário de sua fundação.
Impressiona muito no filme a vulnerabilidade de Quemlândia, cuja destruição pode acontecer a qualquer momento e por ação de fatores mínimos. Qualquer desarranjo na ordem natural das coisas, um vento mais forte ou o bloqueio da luz externa pode colocar fim à pequena civilização.
As similaridades com o mundo em que vivemos são óbvias demais. Entretanto, vale perguntar sobre a verdadeira intenção dos autores de tramas desse tipo. Em se tratando teoricamente de um filme para crianças seria educativa a sua finalidade? Talvez. Não se pode negar que certa compreensão sobre a pequenez do homem talvez contribua para a formação de pessoas mais afeitas aos bons costumes e crença em valores universais. Em sentido diametralmente oposto situa-se, inevitavelmente, certo achatamento da condição humana, fraca, vulnerável e absurda quando se levam em conta as verdadeiras circunstâncias da nossa existência. Trata-se de algo como lembrar-se de que a vida existe na Terra há cerca de 4,5 bilhões de anos, mas a espécie humana é bastante recente no planeta: o primeiro Homo sapines sapiens surgiu a menos de 200 mil anos.
Filmes desse gênero cativam pela beleza das imagens, finais felizes e lições de solidariedade e perdão entre os seres. Mesmo os vilões são capazes de se arrepender e derramar lágrimas quando diante de velhos clichês como inimigos abraçando-se e prometendo viver em paz para todo o sempre.
Tenho exata noção de que posso estar interpretando narrativas do gênero em questão sob um viés incomum e talvez incorreto. Mas, não posso deixar de pensar assim. O fato é que desde os meus primeiros estudos, quando compreendi a posição da Terra – o “meu” planeta – dentro do universo, fui tomado pela impressão de que éramos frágeis demais e talvez a nossa história pudesse ter um fim inesperado de um momento para outro. Quando aprendi que a era dos grandes répteis terminou pela ação do choque de um grande corpo celeste contra a Terra, levantando imensa nuvem de poeira, os meus temores se agravaram.
Agora leio na capa da Revista Veja sobre o tal fim do calendário maia e a possibilidade do fim do mundo em 2012. Fico incomodado com isso, como fiquei há muitos anos quando li que o governo norte-americano enterrara cápsulas com informações sobre a nossa civilização para o caso de desaparecermos e um dia seres inteligentes ressurgirem na Terra.
A minha intenção não é transformar um filme infantil numa peça de terror. Mas não é demais lembrar que o pior terror não é o explícito, o pior é aquele que acontece às claras, sem monstros nem nada, terror como aquele de uma manhã calma em Hiroshima de repente interrompida por uma bomba vinda do céu.