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A falta de sentido das tragédias
Ao ver imagens da tragédia ocorrida em Santa Maria não pude deixar de me perguntar por que, afinal, continuava preso à TV, presenciando cenas de sofrimento inenarráveis, perdas irreparáveis e o estupor diante de algo colossal cuja falta de sentido faz-nos desconfiar da lógica da própria vida. Que sentido pode haver em algo tão terrível, num incêndio que em poucos minutos rouba a vida de mais de duzentos jovens, eles que minutos antes se divertiam dentro de uma boate? Que estranha combinação de fatores influiu na possibilidade da presença justamente daquelas pessoas, naquele lugar, naquele horário, para que juntas participassem e fossem envolvidas por algo inesperado e que roubaria a elas a vida? E por que eu me irmanava àquele sofrimento, ficando junto da TV, ouvindo e vendo informações repetidas que, no final das contas, em nada mudavam o fato maior, o desparecimento precoce de tantos jovens?
Obviamente não tenho respostas para essas perguntas, talvez ligue o fato ocorrido à preocupação que temos com os nossos filhos, esses seres que se alongam de nós e andam por aí, em meio a tantos perigos que escapam à nossa capacidade de proteção. É colocando-nos no lugar dos pais que choram a perda dos filhos que a tragédia de Santa Maria nos abate, arremessando-nos à zona de silêncio irremediável pela qual trafegam os que se defrontam com catástrofes irreversíveis.
Do incêndio na boate de Santa Maria restam inúmeras perguntas que vão sendo feitas na medida em que o tempo passa e a dimensão da tragédia se avulta. De repente, as pessoas mortas aparecem, seus nomes e faces são-nos revelados e os mais de duzentos deixam de ser massa uniforme para transformar-se em cada um, o ser que parte e deixa atrás de si um rastro de dor. Adentra-se agora o território das responsabilidades, da apuração dos fatos, da eleição dos responsáveis. Entretanto, ainda que a justiça seja feita com a punição de possíveis responsáveis, nada, absolutamente nada, remediará os fatos ocorridos em toda a sua extensão.
Não há como passar incólume por acontecimento de tal monta. Não há como ignorar o que aconteceu na cidade do Rio grande do Sul. Não há como não se identificar com aqueles que perderam, no incêndio, entes queridos. Não há como voltar no tempo e impedir que as pessoas entrem na boate prestes a arder em chamas. O que resta é chorar e torcer para que as autoridades façam a parte delas, impedindo que novos e tão trágicos acontecimentos se repitam.