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Jornalismo de denúncia

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Tornou-se rotina no jornalismo brasileiro: não se passam mais que poucas semanas - às vezes a coisa é quase ininterrupta – para que seja noticiado um escândalo envolvendo personalidades públicas em atividade no governo ou no Congresso. Há poucos dias ressurgiu o caso dos “Aloprados”, dossiê que teria sido encomendado contra José Serra; na sequência está em pauta o Ministério dos Transportes suspeito de elevação de verbas de onze obras. Isso para ficar no mais recente. Um pouco mais atrás está o caso de Erenice Guerra, o mensalão do DEM, aquele outro mensalão e por ai vai.

De todo modo fica claro que os últimos anos foram pródigos em denúncias de negociatas, coincidindo com o período de governos de pessoas que, no passado, proclamavam-se campeões da honestidade. Esses fatos suscitam aos brasileiros perguntas difíceis de responder. Afinal o que acontece? Teria se tornado o jornalismo de denúncia um derivado do sensacionalismo que, afinal, atrai leitores e vende muito? Não haveria algum exagero persecutório na busca incessante de desmascaramento de pessoas e mesmo órgãos do governo? Teria o país sido entregue a uma mal parida e formidável geração de corruptos que praticam a corrupção compulsivamente como se fosse ela traço inalienável do caráter dos políticos? Estaria em vigor legislação de tal modo leniente, constituindo-se em verdadeiro convite às transgressões? Teríamos atingido um ponto irreversível no qual o espaço público estaria aberto a toda sorte de maquiavelismos de que é capaz o animal político? Afinal, qual a raiz de comportamentos como o de prefeitos acusados de corrupção, ministros denunciados de falcatruas, presidentes acomodando-se ao vai-e-vem de necessidades partidárias, desvios de dinheiro público, lodo de negociatas, favorecimentos etc?

Parodiando a letra da música, alguma coisa acontece no coração do Brasil que resiste bravamente à corrupção. Um novo tipo homem parece habitar as instâncias superiores nas quais não hesita em colocar interesses pessoais, ainda que escusos, à frente dos interesses do Estado. O manto do crescimento do país confere a ilusão de destino glorioso, mas acobertando situações absurdas que, sob o ritmo frenético de declarações ufanistas, são encaradas como normais dentro de um processo de amadurecimento.

Enquanto isso o inverno segue. Temperaturas baixas no sul do país flagelam pobres. Um casal e seus sete filhos moram numa casa de tábuas e dispõe de apenas dois cobertores. É aprovado um pacote de benefícios fiscais para a construção de um estádio para o Corinthians em Itaquera. Publica-se que a União pagou R$ 14 milhões por internações de mortos. O BNDES está para patrocinar com a quantia de R$ 4 bilhões um acordo entre o Pão de Açúcar e o Carrefour. E esperamos, sem ansiedade, as próximas denúncias envolvendo órgãos e personalidades públicas. Exagero? Tudo certo? Tudo errado?

Há muitos invernos não fazia tanto frio no sul do país.