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O complexo de vira-lata
A expressão “complexo de vira-lata” foi cunhada pelo escritor Nelson Rodrigues após a perda da Copa do Mundo de 1950 pelo Brasil. Segundo Nelson Rodrigues a expressão não se limitava ao campo futebolístico, aplicando-se a muitas outras situações. Nas palavras de Nelson:
- por “complexo de vira-lata” entendo eu a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo.
Dias atrás a expressão “complexo de vira-lata” reapareceu na mídia em função de uma declaração do presidente Lula que mais uma vez alfinetou o seu antecessor, o ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso. Segundo Lula o país cresceu no concerto das nações durante o seu governo e hoje é respeitado em todo o mundo. Já não acontece o ocorrido com o então chanceler do governo Fernando Henrique, Sr. Celso Lafer, que em visita aos EUA viu-se obrigado a tirar os sapatos no aeroporto durante o processo de imigração. Recorde-se que o fato ocorreu logo após o ato terrorista de 11 de setembro quando os EUA dificultaram ao máximo a entrada de estrangeiros em seu país.
Talvez se possa mesmo dizer que o “complexo de vira-lata” seja mesmo coisa do passado, embora tenha sido usado mais recentemente até no exterior em referência ao Brasil e seu povo. Deixando de lado as antigas hipóteses de inferioridade racial decorrentes da miscigenação - que tanto empolgaram a própria elite cultural do Brasil nas primeiras décadas do século XX - ainda assim o tal complexo fez parte do cotidiano dos brasileiros, muitas vezes traduzindo-se na admiração cega e cópia pura e simples de hábitos e costumes de povos mais avançados. Certa dose de subserviência política e econômica, manifesta pela precariedade das condições do país ao qual não se atribuía seriedade de propósitos, aparentemente justificava um olhar superior e condescendente de outras nações sobre o Brasil.
Entretanto, é importante frisar que essa situação começou a mudar, visceralmente, com a chegada de Juscelino Kubitschek à presidência da República, em 1956. É mesmo o caso de se dizer que “nunca antes na história desse país” se viu coisa igual. Juscelino era alegria, capacidade, ousadia e esperança, tudo isso numa só pessoa. Homem de riso fácil e muitas habilidades ele empreendeu grande reviravolta na então morosa vida brasileira, impondo a si e ao país um ritmo frenético de realizações que se traduziam no tão sonhado desenvolvimento. Seu plano de metas, o chamado “50 anos em 5”, revolucionou a história do país que, da noite para o dia, viu-se envolvido na realização de obras de vulto, como a construção de Brasília no Planalto Central, ora comemorando-se 50 anos desde sua inauguração.
O interessante é que Juscelino colocou o país para correr e todos correram com ele. De repente o estagnado país que se traumatizara no Maracanã em 50 vencia a Copa do Mundo, realizada na Suécia, em 1958; Eder Jofre tornava-se o primeiro brasileiro a ser campeão mundial de boxe, categoria peso galo; ganhava impulso a indústria brasileira; a Volkswagen produzia, em sua fábrica no ABC, o primeiro fusca brasileiro; Maria Ester Bueno vencia e sagrava-se a primeira tenista do mundo no torneio de Wimbledon; a bossa-nova de João Gilberto e Tom Jobim explodia no país e ganhava o mundo; João Guimarães Rosa publicava “Grande Sertão Veredas; Glauber Rocha impulsionava o cinema-novo; e por aí afora.
Não é por acaso que os anos do governo JK ficaram conhecidos como “anos dourados”. Neles o Brasil integrou-se mais solidamente ao mundo, deixando para trás o complexo de vira-lata. Atrás de um presidente jovial e alegre constituía-se um povo maduro e competitivo.
Há quem não acredite ou simplesmente desconheça, mas o Brasil tem História. E nunca é demais lembrar que o país que aí está foi construído por muitas, muitíssimas mãos, que trabalharam e lutaram pelo crescimento e importância da terra em que nasceram.