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No tapete vermelho do Oscar
Todo mundo conhece o cerimonial do Oscar e ainda assim a festa do cinema norte-americano continua atraindo as atenções do grande público. Há quem diga que assistimos à festa de premiação só pela curiosidade de saber quem foram os melhores do ano anterior, enfim os vencedores. Cada um tem o seu palpite após ter visto vários filmes, a isso se podendo acrescentar preferências pessoais sobre esse ou aquele ator, a melhor direção, a melhor atriz etc.
Era barbada que Christoph Waltz receberia a estatueta pela sua excelente atuação em “Bastados Inglórios”, nem tanta certeza havia em relação a Sandra Bullock para o prêmio de melhor atriz, ela que já trabalhara em tantos filmes e jamais recebera sequer uma indicação para o Oscar.
Tudo isso atrai, é verdade. Conta muito também o glamour da festa, ainda que depois da última crise econômica os exageros tenham sido reduzidos por medida de economia. Há também aquela coisa de se ver tanta gente do show business junta, todos sentadinhos na platéia do Teatro Kodak, muito sorridentes, pré-determinados a rir daquelas piadas meio sem-graça de que os americanos tanto gostam.
Mas, o que realmente é muito interessante é o que se passa no tapete vermelho, antes da festa começar. Em primeiro lugar há a parte reservada ao público, os mortais comuns, que se apertam numa pequena arquibancada para ver passar os ídolos do cinema. Consta que aquela turma consegue lugares ali através de um sorteio realizado pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas dos Estados Unidos. Qualquer pessoa, de qualquer lugar pode ser sorteada, mas é de se pensar se alguma influência e dinheiro não ajudam em nada. De todo modo, estar ali representa uma ligação direta com o endeusamento de ícones de popularidade que de repente se fazem carne e habitam entre os cinéfilos. Reina entre os assistentes uma estranha e irresistível compulsão de não só ver, mas reconhecer cada pessoa que passa. É como se bem perto do lugar da celebração do Oscar existisse um cinema e aquela gente toda, tão chique e importante, tivesse momentaneamente saído da tela para aparecer em público, não sendo possível ponderar sobre a quantidade de cotas de realidade e ilusão que compõem as cenas que se passam diante dos olhos dos espectadores.
Não se pode negar que os atores são, de fato, um espetáculo a parte. O cinema é uma fábrica de ídolos em tamanho grande, dado que os atores parecem enormes na telona. A dimensão das projeções permite que os espectadores conheçam cada ator em seus mínimos detalhes. Quem não sabe de olhos fechados os detalhes faciais e a expressividade de que é capaz uma atriz como Maryl Streep, por exemplo? E que dizer de Jeff Bridges que acaba de receber o Oscar de melhor ator?
Pois o público conhece toda essa gente e muito bem. Essas pessoas fazem parte do cotidiano do povo, frequentando assiduamente as suas casas através de filmes exibidos na televisão. Vai daí que no momento em que eles se dignam a desfilar sobre o tapete vermelho o fazem num estilo que nada tem de corriqueiro, a começar pelas roupas de grife das atrizes que, ao serem entrevistadas, informam o nome do costureiro que as vestiu. O interessante é que ninguém ali se apresenta com naturalidade de vez que cada um representa, durante o rito de sua passagem, o papel de convidado ou possível premiado.Trata-se, portanto, de uma formidável ilusão desgarrada temporariamente das telas dos cinemas. Isso quer dizer que tudo o que o público das arquibancadas presencia ou o que vemos pela televisão não passa de uma enorme ficção, um capítulo bem encenado da indústria do cinema no qual o que menos interessa é a realidade.
É assim que os atores passam e concedem entrevistas, ouvindo as mesmas perguntas e respondendo do mesmo modo porque o que interessa é o fato de estarem ali, cumprindo a primeira fase de uma extensa programação, preparando-se para a cena seguinte que é a de participar efusivamente da cerimônia de entrega de prêmios.
Mas, no fundo, nada disso importa. Os espectadores conhecem muito bem a rotina do Oscar e sabem que inexistem surpresas, exceto os prêmios concedidos o que, aliás, nem sempre é o mais importante. A verdade mesmo é que assistimos à festa do Oscar para reverenciar um mundo de ilusão que num certo dia do ano brinca de ser real e nos dá oportunidade para muita tietagem.