papéis de Peter O’Toole no cinema at Blog Ayrton Marcondes

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Peter O’Toole

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Meu pai vez ou outra falava sobre aquilo que chamava de ”baixas na paisagem”. Referia-se ele a um despovoamento de gente do seu tempo, pessoas que desapareciam levadas pela morte. Para ele essas lacunas nunca seriam preenchidas: o mundo que ele conheceu desmoronava e novas pessoas não poderiam ocupar na memória dele os lugares vazios. Desse modo entendia ele que pouco a pouco a paisagem mudava, tornando-se desértica. E não se tratava apenas de pessoas que viviam no mesmo meio que ele: grandes vazios surgiam com a morte de ícones do tempo em que viveu, as personalidades que chamavam a atenção geral e forneciam assunto para as conversas.

Há gente que contribui para a formação do nosso imaginário, algumas delas tornando-se inesquecíveis. Grande papel é exercido por atores que encarnam personagens muitas vezes tão reais que os tomamos como verdadeiros e não nos esquecemos deles. Os grandes atores desfrutam de uma fabulosa capacidade de transformação tanto que nos surpreendem com interpretações na pele de personagens que nada têm a ver um com o outro.

Peter O’Toole que morreu no último sábado pertencia a uma elite capaz de se transfigurar nas telas a ponto de, durante os filmes, levar-nos a esquecer o ator em favor da personagem interpretada. Magro, alto e com olhos de um azul ofuscante O’Toole preenchia o espaço da tela, muitas vezes eclipsando aqueles que com ele atuavam. Deu-nos personagens realmente maravilhosos a começar pelo Lawrence da Arábia que o tornou mundialmente conhecido através de usa magnífica atuação. Depois desse filme, da década de 1960, O’Toole fez de tudo no cinema. Quem não se lembra dele interpretando tramas baseadas na obra de Shakespeare ou, já no final da carreira, dentro da pele daquele maravilhoso Maurice no filme “Venus” que valeu a ele a oitava indicação para o Oscar?

Peter O’Toole morre e deixa um enorme vazio que só mesmo outro alguém como ele poderia preencher. Sendo isso impossível, ficamos com suas imagens para sempre gravadas nos filmes o que de alguma forma nos serve de consolo: poderemos revê-lo e fruir de suas sempre majestosas interpretações.

Ontem participei de uma reunião de negócios e, no meio dela, inesperadamente, alguém lembrou a morte de Peter O’Toole. Creio que se passaram bem uns quinze minutos com pessoas falando sobre este ou aquele personagem interpretado pelo ator. A certa altura um senhor falou sobre um filme no qual O’Toole fez um oficial nazista. Disse ter sido de tal magnitude a interpretação do ator que ele, espectador, foi levado a sentir pena do oficial quando foi punido pelo o exército de Hitler. E, contudo, o oficial era um homem muito mau que não merecia nenhuma consideração. Mas, acrescentou o senhor, o caso era o de que o ator que interpretava o oficial conferia a ele pelo menos um fiapo de humanidade.