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Mentiras e desculpas
Divulga-se que uma pessoa normal mente pelo menos três vezes por dia. Desde que li a notícia tenho me policiado para verificar a minha média diária de mentiras.
Mentira é o que não é verdade, não corresponde a ela. Há pequenas e grandes mentiras, algumas graves e com consequências. O marido que trai em geral não mente, mas omite. Se a mulher desconfia, se ela coloca o marido contra a parede, então surge a mentira que consiste na negação absoluta da traição, Às vezes o marido se entrega ao desempenho de verdadeira peça teatral no sentido de inocentar-se de uma acusação tão grave cuja confirmação pode até levar ao fim o casamento.
Conheci um mulherengo inveterado que sabia mentir como poucos. Era verdadeiramente um artista na arte de convencer a mulher de sua retidão. E ela acreditava. Até que compraram uma casa na praia para onde ele ia vez ou outra, dizendo participar de pescaria com amigos.
Aconteceu de uma noite estar ele com uma mulher em pleno ato quando a porta do quarto foi aberta pela esposa. A mulher que estava com o homem na cama fugiu, nua, levando consigo as roupas que vestiu no caminho. Ele? Veterano na safadeza, artista sem palco, sentou-se na beira da cama, nu, pondo-se a socar a própria cabeça, chorando e exclamando:
- Eu tenho a cabeça fraca, eu tenho a cabeça fraca…
Boa desculpa. A esposa parece ter-se convencido e perdoou o marido, mas não por muito tempo porque, passados alguns meses, pediu a separação. Depois de separados ele continuou seguindo a velha rotina, mulher aqui, mulher ali, agora sem precisar da invenção de álibis salvadores.
Confesso que não minto, apenas omito coisas que acho bobagem dizer. Chega-se a uma fase da vida na qual se descobre que as pessoas não querem saber a verdade porque a realidade pode doer. Nesta situação o que resta fazer é alegar ignorância sobre coisas que afinal pertencem à vida alheia.
Uma senhora me liga com alguma frequência perguntando-me sobre doença grave de pessoa a quem ela ama muito. Está ela na fase da vida em que as coisas pesam demais e o sofrimento pode tornar-se insuportável. Não minto para ela, apenas omito os detalhes da doença. Assim, segue ela os seus dias, acreditando nas descrições que faço a ela e que a consolam. Entretanto, às vezes tenho a impressão de que ela conhece muito bem a verdade, mas optou por viver melhor acreditando no que digo a ela. Mentimos um ao outro? Parece que sim.