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Outono
Do pinheiro altíssimo caem folhas, por vezes até ramos pequenos que cobrem o solo cimentado. Há 30 anos encontrei um pinheirinho jovem na beira da estrada onde caminhava. Condoí-me dele, da morte prematura que o aguardava ali, na beira do asfalto. Peguei-o com o cuidado com que se segura um recém-nascido e levei-o para casa.
Plantei o pinheirinho e cuidei dele para que o frio do inverno não o matasse. Regava-o com água e cheguei a colocar na terra um pouco de fertilizante numa ocasião em que ele parecia já não ter forças para resistir.
Mas, o pinheirinho sobreviveu. Cresceu, ganhou corpo, engrossando o caule até tornar-se essa árvore majestosa que fica defronte à minha casa. Fez mais: de suas sementes apareceram à meia distância os outros pinheiros que hoje se distribuem numa fila ordenada. Às vezes penso no olhar do primeiro pinheiro - aquele que plantei - sobre os outros, seus filhos. Ele é o chefe da família, ocupa posição de destaque, é maior que os outros. Às vezes me parece que o meu pinheiro é orgulhoso por ter cumprido à perfeição o papel dele na natureza. Nem poderia ser de outro modo em se tratando dele, altaneiro e fortíssimo como se tornou.
Acontece que o meu pinheiro cresceu na encosta de um pequeno morro e suas raízes estenderam-se até a casa. Não terá sido essa a primeira vez em que tive que refazer a calçada arrebentada pela força de raízes dele que se propagam para todo lado. Mas, faço isso com gosto: dá-me alegria saber que o meu pinheiro está forte e continua crescendo, quem sabe um dia ele alcance as nuvens ou toque o céu.
Entretanto, de tempos para cá o meu pinheiro começou a incomodar. Tempos atrás apareceu em casa um fiscal da prefeitura para me dizer que talvez fosse necessário cortar o pinheiro dado o risco de ele cair e arrebentar tudo o que encontrasse pela frente. Um funcionário da companhia de luz também veio para alertar-me sobre os riscos do pinheiros atingir a fiação elétrica e destruí-la. Finalmente, o meu vizinho veio me visitar, inesperadamente, e falou sobre as mudanças ambientais e ventos fortes que antes não chegavam à nossa rua. Com muito jeito perguntou-me se não seria melhor cortar o pinheiro que poderia até cair sobre a minha própria casa.
Eu não disse a nenhuma dessas pessoas que o pinheiro na verdade é um filho a quem amo muito. Cuidei dele na infância e ele tem presenciado os altos e baixos que tenho experimentado ao longo da vida. Ele é não só um amigo, como confidente ao quem revelo os meus mais íntimos segredos nos momentos em que me parece que nenhum ser humano seria bastante para compreender as minhas aflições. Por essa razão resistirei até a morte a todas as tentativas de cortarem o meu pinheiro.
Considero que a vida do meu pinheiro está ligada à minha indissoluvelmente. Faz ele parte do pouco de bom que fiz nesse mundo e quero deixá-lo ali como testemunho da minha passagem por aqui quando morrer. Por isso alegra-me tanto vê-lo a perder suas folhas neste outono, preparando-se para o inverno que está por chegar. Passaremos juntos o inverno e na primavera, ah, como ele se enfeitará e ficará belo, alegrando as minhas manhãs de sol.