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Dentro da Gaiola de Faraday
Os professores de física ensinam que se uma corrente elétrica atravessa um corpo metálico ela passa somente pela superfície externa dele. Esse é o princípio da Gaiola de Faraday que, entre outras coisas, explica porque você não é atingido quando um raio cai no seu carro.
Muita gente se pergunta sobre o que acontece quando raios caem em aviões em pleno voo. Isso pode acontecer durante uma tempestade. Então você está ali na sua poltrona, com o cinto afivelado, quando de repente ouve um estrondo. Calma, não aconteceu nada, o avião não vai cair, foi só um raio. O avião funcionou como uma Gaiola de Faraday e a eletricidade trazida pelo raio percorreu apenas a parte externa dele.
Certa vez estava eu num voo em direção ao nordeste. Ao meu lado viajava uma moça bonita com a qual não me atrevi a puxar assunto. Íamos assim, calados, cada um lendo a sua revista quando se ouviu um estouro que assustou os passageiros. Logo em seguida falou o comandante, recomendando aos passageiros que ficassem sentados e com os cintos afivelados.
Você sabe como as coisas se passam na cabeça da gente numa hora dessas. Não há como não se pensar no pior. Turbulência e explosão e você dentro de um avião lá nas alturas! Pois não demorou nada e ouviu-se outro estrondo. Nesse momento a moça bonita ao meu lado agarrou-se ao meu braço, talvez achando que chegara a nossa hora, morreríamos num desastre aéreo.
Se há uma coisa terrível quando se está numa situação perigosa é essa de o tempo demorar a passar. Dois minutos são uma eternidade quando se está atravessando uma zona de turbulência. Mas, a situação em que estávamos finalmente passou e as coisas melhoraram. Só então o comandante explicou que aquela barulheira toda fora provocada por raios que atingiram o avião.
Mas, valeu o preço pago pelo susto. A partir daí eu e a moça passamos a conversar e nos tornamos amigos. Tão amigos que marcamos um jantar na capital do nordeste para onde eu viajava a trabalho.
Naquela época eu vivia sozinho de modo que me considerei sortudo pelo fato da moça ter aceitado o meu convite. Na noite da sexta-feira - a combinada - liguei para ela e não fui atendido com satisfação ou pelo menos com alguma vivacidade. Explicou-me ela ser mulher casada e não saber dizer o que lhe dera na telha ao marcar um jantar comigo. Desculpou-se e as coisas ficaram assim.
Até hoje não sei dizer se essa história de fato aconteceu. Tempos depois vi numa revista de circulação nacional uma foto da moça com quem que sentara no avião. Da certeza de que era ela parti para a dúvida e nunca cheguei a nenhuma conclusão. De uns tempos para cá tenho pensado que talvez eu tenha inventado essa história. Eu teria estado num avião que funcionou como Gaiola de Faraday e, assustado, fechei os olhos e inventei uma linda moça ao meu lado só para me acalmar. Quando ao tal jantar, talvez eu tenha acrescentado esse final depois.
De todo modo nada disso importa. Numa época em que se discute se o nosso mundo e nós mesmos não seríamos seres virtuais, criados em computador por um programador de uma civilização avançada, que importância teria uma dúvida entre a realidade e a ficção?