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Novos imbróglios
Janeiro avança e o ano vai tomando o mesmo o contorno dos anteriores. A calmaria do fim de ano depressa desaparece. Em fevereiro terminarão as férias escolares, todo mundo voltará para casa e a vida se “normalizará” dentro dos aspectos de sempre. O trânsito – que já se complica – vai piorar, deixando as ruas do jeito insuportável a que estamos habituados.
Mas, é sabido e notório o fato de que, no Brasil, o ano só começa mesmo após o carnaval. Terminada a folia, instaurados os arrependimentos da quarta-feira de cinzas, o olhar dos mais incautos dirige-se para o horizonte, mais precisamente para o futuro. Teremos, sim, neste ano alguns feriados providenciais, bem situados no calendário de modo a facilitar as tais emendadas, mas vem aí um ano duro e difícil no qual a nossa alegria dependerá do bom humor da economia, da melhora da crise internacional. Entretanto, o melhor é só pensar nisso após o carnaval, afinal ninguém é de ferro, viver é preciso, fingir que nada de mal pode acontecer também é preciso.
Enquanto o carnaval não chega coisas continuam acontecendo sem que nos demos ao trabalho de registrá-las. Trata-se do olhar através de lentes telescópicas como qual o observador percebe fatos como muito distantes dele, que, portanto, não lhe dizem respeito. Vez ou outra um acontecimento é mais inflamado, cutuca mais, obriga-nos a pensar mais detidamente sobre ele porque se torna impossível ignorá-lo. Creio que a esse grupo de coisas marcantes filia-se a batalha campal que atualmente acontece na região de São José dos Campos onde inúmeras famílias estão sendo desalojadas de uma área - Pinheirinho - num movimento de reintegração de posse.
A questão do que acontece nesse momento ultrapassa o direito de posse e mesmo a obrigatoriedade de retirada das famílias do terreno. Nem mesmo a reação violenta dos moradores, o protesto com interdição da Via Dutra, a ação dos policiais atirando bombas de pimenta e balas de borracha, o incêndio provocado nas casas, tudo isso junto não impressiona tanto quanto a situação de desgraça de famílias que circulam com mulheres e crianças sem noção do que fazer em seguida, sem ter para onde ir.
O resultado da ação – ainda em andamento – contabiliza pessoas feridas, prédios públicos e carros incendiados. Da população de 6000 pessoas que vivem no local mais da metade já se foi. O exército de moradores armados com porretes, escudos de pau e capacetes de motociclistas resiste.
A área do Pinheirinho soma 1,3 milhão de metros quadrados e foi ocupada há 8 anos, constituindo-se num verdadeiro bairro onde existem quadras, igrejas e ruas. Se por um lado a decisão da Justiça deve ser colocada em prática, por outro é preciso considerar a terrível situação social enfrentada pelos moradores da área, agora desalojados.
Vi na TV algumas famílias de desalojados recebidas num galpão. Servia-se alimento numa mesa ocupada por crianças. Comiam em silêncio, certamente sem compreender a dimensão do conflito de interesses que as levou a tornar-se desabrigadas.