Arquivo para ‘Spartacus’ tag
A posteridade
Cena de cinema que ficou gravada na minha memória: Spartacus e seus soldados crucificados ao longo de uma estrada romana. Como não poderia deixar de ser o império romano sufocou a rebelião de Spartacus e seus gladiadores deles restando, talvez mais que as ações praticadas durante a revolta, os corpos presos às cruzes, onde morreram.
Júlio Cesar - cujas ações contra a República Romana se deram nos 50 anos que precederam o nascimento de Cristo - é lembrado por participações em vários momentos de sua vida. O momento de travessia do Rubicão, o “Vim, vi e venci”, e a própria morte dele sob as mãos de Brutus fazem parte de contexto bastante conhecido e sempre citado.
Entre nós Nelson Rodrigues está entre os escritores mais lembrados. A todo transe Nelson é citado na mídia, seja ele mesmo ou as incríveis personagens e situações que nos deixou em seus livros. Nelson caracterizou-se como uma espécie de “outro olhar” sobre nós mesmos: desvestiu os seres humanos de suas aparências para mostrá-los nus e sob o comando de seus instintos.
Spartacus, Júlio César e Nelson Rodrigues. O que há de comum entre esses três homens? Creio que apenas o fato de permanecerem vivos nas memórias, cada um através da legenda criada ao longo de sua vida. Mortais comuns destacaram-se eles por ações incomuns que conferiram perenidade às suas memórias.
Enfim, este pretende ser um texto sobre memórias. Ao citar aleatoriamente três personagens, escolhidas ao acaso, buscava-se justamente imaginar o que se dirá, daqui a alguns anos, sobre pessoas que atualmente ocupam o noticiário. Dentre elas o grande destaque do momento é Muammar Gaddafi, líder líbio que acaba de ser morto por forças revoltosas. Sobre a longa carreira de Gaddafi e a mão de ferro que utilizou para governar o seu país pouco há a se acrescentar de vez que o assunto é de domínio público. Entretanto, as circunstâncias ainda não totalmente esclarecidas da morte do ditador líbio estão dando o que pensar. Gaddafi estava num túnel de esgoto e foi retirado de lá com vida. Relata-se que, depois de sair, deu cerca de dez passos, e foi atingido por disparos. As cenas seguintes, mostradas em vídeos muito confusos, são terríveis: um ex-ditador ainda vivo é carregado pela turba e não se sabe dizer com precisão o momento em que ele morreu. Depois disso eis o corpo do ex-ditador, acompanhado do de seu filho, também morto, exibidos num frigorífico onde o visitam pessoas que parecem querer certificar-se de que, de fato, a era Gaddafi terminou.
Não é difícil imaginar o que se dirá sobre Gaddafi daqui a alguns anos. O que não é possível afirmar é se a memória do ex-ditador líbio será duradoura. Por enquanto Gaddafi não passa de um cadáver insepulto, reclamado por sua família que clama por enterrá-lo. Isso e nada mais nesse fim de cena trágico e algo patético do desaparecido líder líbio.
Enquanto a memória de Gaddafi permanece, enquanto ele se torna lentamente passado, a Líbia desperta para aquele que, assim se espera, venha a ser um novo tempo. Certamente, nesse momento, o povo líbio não se preocupa com a memória que restará de seu ditador e de seu governo. O que compete aos líbios é deixar de lado o passado e olhar para frente, em busca de solução para o país que lentamente sai de uma terrível ditadura. Assim, a questão de como Gaddafi será ou não lembrado no futuro, fica por conta de observadores que se perguntam sobre o modo de ser das gentes e a permanência dos fatos em suas memórias.
Tony Curtis
Parem tudo: Tony Curtis morreu. O dia deveria ser de luto em todos os cinemas do mundo: nenhuma projeção de filmes.
Tony Curtis fez parte da cultura de uma geração. Há quem diga que não pertenceu à galeria dos grandes atores. É possível. Em todo caso sua simpatia e beleza física fizeram dele presença sempre marcante. Foi assim em seus filmes, mesmo nos piores. Quem não se lembra dele, ao lado de Jack Lemon e Marylin Monroe em “Quanto mais quente melhor”? Nas comédias? E de sua participação em “Spartacus”, ao lado de Kirk Douglas?
A morte de Tony Curtis lembra-nos de que os ídolos, por mais que permaneçam jovens e bonitos nas telas, envelhecem e morrem. Traz também a inquietante sensação de passagem do tempo, de irreversibilidade e mundos desfeitos. Com Curtis parte a atmosfera de uma época vivida, bem mais glamorosa, talvez até mais inocente. Curtis se vai como foram os velhos cinemas dos centros das cidades onde sua imagem fazia sucesso e atraia multidões.
Tony Curtis pertence ao mundo da magia no qual a realidade é sempre intrusa. Talvez por isso a notícia de sua morte surja como algo fora de lugar. O homem de 82 anos que acaba de morrer deixa-nos, como legado, imagens inesquecíveis que jamais serão olvidadas e enterradas. Deriva daí a sensação de que, afinal de contas, nem tudo é finito.
Asta la vista Tony Curtis. Até o nosso próximo encontro, provavelmente num filme exibido pela televisão.