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Histórias de terror
Sou aficionado de histórias de terror. Quando a televisão engatinhava e lugarejos não tinham salas de cinema restava-nos apenas ler. Para minha sorte em casa havia uma biblioteca bem sortida com títulos que iam dos escritores russos aos grandes filósofos, passando por coletâneas de contos e romances. Através daqueles livros conheci a obra de escritores de histórias de terror e personagens como Drácula, Frankenstein e muitos outros. Li de cabo rabo os contos de Edgard Allan Poe, os de ETA Hoffman e muitos outros. Nasceu daí o meu medo de vampiros, lobisomens e seres da noite que, assim imaginava, seriam reais. Coisa de menino/adolescente que, com o passar dos anos, esqueceu-se do medo e ficou com a delícia das narrativas.
Os filmes de terror sempre foram para mim convite a momentos de emoção e curiosidade. Particularmente os filmes de vampiros eram os que mais me atraíam. Assisti a muitos deles, filmados em preto-e-branco, levando às telas histórias de vampiros maléficos combatidos com crucifixos, estacas de madeira, alho e luz solar. Havia sempre o perseguidor de vampiros que fazia uso dos recursos que tinha à mão e acabava sempre vencendo, embora isso acontecesse só depois de muita gente sucumbir aos enormes caninos dos seres da noite. Atores como Bela Lugosi, Christopher Lee, Vincent Price e muitos outros fizeram história no cinema interpretando seres do mal.
Hoje em dia os filmes de terror deixaram de ser interessantes e não porque as narrativas tenham caído em desuso. O que se vê é a valorização do susto com cenas repetitivas que prometem surpresas muitas vezes constrangedoras. Há sempre alguém, em geral mulher, andando dentro de uma casa escura onde seres do outro mundo a surpreendem gerando-se situações violentas. Há exceções, filmes baseados em obras como a do grande mestre do terror Stephen King. Ainda assim verifica-se abuso de recursos especiais na tentativa de criar cenas fantasmagóricas que se tornam ficcionais demais. O terror tem a sua lógica e trabalhar o enredo dentro dela sem exageros pode fazer do filme uma peça verdadeiramente aterrorizante. Ficam de lado os massacres com serras elétricas e as tais sextas-feiras à noite nos quais se misturam sustos, muito sangue, poderes excepcionais e tantas vezes a criação de personagens inverossímeis demais. Não é demais lembrar que a boa ficção exige pelo menos alguma verossimilhança em relação aos assuntos tratados.
Stephen King escreveu “O Iluminado” que o diretor Stanley Kubrick levou às telas do cinema. King não gostou do filme, dizendo que o escritor interpretado por Jack Nicholson ficou reduzido a um louco com quase nenhuma interioridade. Em todo caso não há como concordar inteiramente com King dado que o filme de Kubrick é de fato impressionante. Se você não leu o livro ou não assistiu a “O Iluminado” eis aí excelente oportunidade para desfrutar de uma excelente narrativa de terror. Claro que nãos se recomenda a quem tem muito medo daquilo que existe nas sombras…
A turma do deixa-disso
A coisa mais perigosa do mundo é a rotina. Tudo o que vira rotineiro corre o risco de se tornar aceitável. É assim que coisas tremendas são incorporadas ao imaginário coletivo, quase assumindo a condição de irreais. Acontecimentos distantes, por mais violentos que sejam, encontram no cidadão resistência de percepção: é com o se o cérebro construísse uma barreira para que situações inaceitáveis não nos abalassem tanto. E, assim, vai-se vivendo.
O Brasil é o país da turma do deixa-disso. Terra de contrastes, assim disse Roger Bastide. O brasileiro é um bom sujeito, sendo que alguns são dados a deslizes de gradações diferentes. Povo alegre, empreendedor, louco por uma festa, carnavalesco, responsável, trabalhador, enfim um verdadeiro poço de contradições marcadas sempre por alguma boa-vontade. Mais: não creio que exista em todo planeta outro povo com tão grande capacidade, senão de perdoar, pelo menos de esquecer. Para isso contribui o acúmulo de notícias ruins contra as quais se estabelece um tipo de catarse perigosamente engajada em conformismo. É assim e pronto. Disso se aproveitam os brasileiros dotados de caráter voltado para a desfaçatez, os que apostam na credibilidade popular. Muitos deles fazem história e chegam a governar.
Um caso típico que se ajusta à perfeição às considerações acima é esse do vazamento de dados fiscais para a confecção de dossiê. Então o secretário da Receita Federal declara a senadores que servidores do órgão por ele chefiado acessaram as declarações de Imposto de Renda de um político adversário do governo. Entretanto, os nomes dos servidores que cometeram tal crime não serão revelados porque existe um prazo para que isso seja feito, prazo esse que justamente se esgotará após a data prevista para as eleições presidenciais.
Você lê uma coisa assim nos jornais e pula para o caderno de esportes: trata-se da referida busca de catarse. É preciso não confundir o mundo real da sua vida pessoal com o mundo imaginário em que vivem as pessoas que praticam e concordam com coisas assim. No fim não vai dar em nada mesmo porque a turma do deixa-disso já está em ação, provavelmente trocando favores para que mais esse caso seja abafado.
O fim de semana vem aí. O serviço de meteorologia afirma que o tempo ruim vai continuar de modo que você ficará em casa, protegendo-se da chuva e do frio. Nessas condições o meu conselho é para que você não leia jornais. Compre um livro de terror, uma daquelas histórias atemorizantes do Stephen King, por exemplo. Uma delas, chamada o ”O cemitério” é ótima sugestão: é terrível, embora bem menos do que se lerá no noticiário dos jornais do fim de semana.