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Terrorismo
Quase 4 milhões de pessoas saíram às ruas de Paris numa gigantesca manifestação contra o terrorismo. Os dois terroristas que invadiram e mataram os cartunistas do jornal Charlie Hebdo foram caçados pela polícia, encontrados e mortos. O terrorista que invadiu um mercado e matou quatro reféns também está morto. A Al Qaida assume a responsabilidade pelas ações e promete mais. O mundo ocidental queda-se estarrecido. O islamismo é visto pela extrema direita como o grande inimigo. Teóricos apressam-se em separar o islamismo de ações terroristas executadas em nome dessa religião. A frase “Eu sou Charlie Hebdo” é repetida no mundo como sinônimo de repulsa aos ataques e defesa da liberdade de expressão. Surgem os “Eu não sou Charlie” dizendo-se contrários ao ato terrorista, mas lembrando que os cartunistas abusaram nas ofensas a Maomé e ao Islã. Comentaristas em vários países escrevem que nenhum jornal dos EUA, por exemplo, publicaria as charges do Charlie Hebdo. Um professor universitário escreve que o episódio ocorrido em Paris dá oportunidade a retrógrados da universidade saírem da toca, favoráveis que seriam ao ataque. Cartunistas em todo o mundo publicam charges em homenagem aos colegas chacinados. O que nem todo mundo confessa pode ser expresso numa só palavra: medo.
Há quem se lembre de citar o fato de que em países europeus estrangeiros não são benvistos. Muçulmanos pronunciam-se para lembrar que mesmo nascidos na França não recebem tratamento igual ao dispensado aos demais franceses. Na TV conhecido jornalista relata ter vivido 15 anos na Alemanha e explica o significado de ser estrangeiro naquele país. Um professor universitário lembra que os países europeus sempre trataram com violência suas colônias e cita como exemplo o caso da Argélia que pertenceu à França.
Nada justifica o ato terrorista contra os jornalistas do Charlie Hebdo. A ocasião, entretanto, desperta lembranças em relação à posição de estrangeiros no velho continente. Na primeira vez que fui a Paris, logo depois de desembarcar em Orly, saí do hotel para ver a cidade. No metrô comprei várias passagens que enfiei no bolso do paletó. Depois de passar pela catraca de uma estação, joguei fora a passagem usada. Minutos depois desembarquei em estação próxima à Torre Eifell. Já na rua fui abordado por policiais que me pediram a passagem do metrô. Em vão expliquei em inglês que a jogara fora. Ato contínuo fui colocado com o rosto voltado para uma parede onde permaneci, braços abertos, por mais de uma hora. Finalmente uma oficial mais graduada concedeu falar comigo em inglês. Ela me propôs ou ser preso ou pagar multa de 100 dólares. Paguei e, já liberado, li nos avisos do metrô sobre a obrigatoriedade de manter a passagem usada para comprovar não ter pulado a catraca. Mas, eu vinha de São Paulo onde as passagens usadas não serviam para nada, coisa que absolutamente não interessaria aos gendarmes.
Um relato como o que acabo de fazer nada tem a ver com os tristes episódios agora ocorridos na França. Entretanto, de algum modo me fazem pensar que talvez a relação com os estrangeiros naquele país deva ser repensada. Quando muçulmanos franceses saem de seu país para serem treinados por terroristas e depois retornam para cometer barbáries, algo está errado e precisa ser revisto. Atribuir atos de terroristas à irracionalidade, radicalismo religioso e mesmo lavagens cerebrais realizadas pela Al Qaida ida ou o Estado Islâmico talvez signifique olhar apenas para um dos lados do problema.