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Dores que não passam
Há, infelizmente, dores que não passam. Muitas delas relacionam-se com o futebol. Até hoje a derrota do Brasil, em 1950, na final contra o Uruguai, é chorada. Em pleno Maracanã e diante de mais de 200 mil pessoas o fabuloso escrete nacional foi derrotado por 2×1. O segundo gol do Uruguai, anotado por Ghiggia, faz parte da mais sofrida memória dos brasileiros. Para quem assistiu ao jogo, impossível esquecer-se da tragédia que entristeceu milhões de brasileiros. Para que se tenha ideia, nas vésperas do jogo do Brasil contra o Uruguai, na Copa de 70, o meu entusiasmo com a seleção nacional foi contido por um senhor de mais idade:
- Mas, olhe, é o Uruguai…
Ele vira o jogo de 50.
Para mim, sempre inesquecível - e dolorosa – aquela que ficou conhecida como a “tragédia de Sarriá”. O grande selecionado brasileiro, comandado por Telê, em 1982, caia frente a Itália num inesperado placar de 3X2 a favor dos italianos. Paolo Rossi, atacante italiano, entrava para a história ao anotar os três tentos italianos.
Hoje em dia o interesse pela seleção anda em baixa. Já não se liga o espírito nacional aos resultados da seleção, talvez pelas mudanças de valores que aconteceram ao longo do tempo. Mas, se voltarmos àquele 5 de julho de 1982, quanta tristeza. O silêncio após o fim da partida contra a Itália era maior que a de um féretro no momento da descida do caixão à cova. Abatera-se sobre nós hecatombe irreparável.
Na ocasião eu estava em São Paulo. Na manhã seguinte ao jogo fui, bem cedo, ao centro da cidade. Saía do viaduto do Chá quando me deparei com a página de capa da edição do dia do “Jornal da Tarde”. Estampada nela, página inteira, a foto de um menino, surpreendido pelo fotógrafo, chorando na arquibancada do estádio de Sarriá, após a derrota brasileira. A foto não era acompanhada por nenhum texto. Só o menino, chorando. Sofrendo. Impactante demais. Ao vê-la fui tomado por enorme tristeza e não pude conter as lágrimas.
Decorridos 37 anos daquela tragédia eis que hoje, ao acaso, me deparei com a velha foto ilustrativa de nossa derrota. Eis que, quando percebi, uma lágrima descia pela minha face. Pois é, há dores que não passam.
Imagem inesquecível
6 de julho de 1982. Dia de grandes silêncios e tristeza geral. Não me recordo a que ia, mas acabava de atravessar o Viaduto do Chá em direção à Rua Barão de Itapetinga. Foi naquele lugar que vi, estampada na primeira página do “Jornal da Tarde”, a inesquecível fotografia do menino chorando. O menino chorava por todos nós brasileiros, impossível conter a emoção de um choro que me dizia respeito e espelhava a tristeza do dia.
O Brasil inacreditavelmente perdera para a Itália num jogo da segunda fase da Copa do Mundo daquele ano. A fantástica seleção nacional que entre outros contava com Falcão, Zico, Cerezo e Sócrates, dirigida por Telê Santana, perdera por 3 a 2 um jogo em que o empate bastaria para a classificação. Era uma formidável seleção aquela cujos jogadores exibiam um futebol encantador, verdadeiro show. E perdêramos, para desolação da imensa torcida brasileira.
O “Jornal da Tarde” conseguira atingir o coração dos brasileiros ao publicar a foto do menino em sua página de rosto. Dava rosto ao sofrimento geral, àquela sensação de algo perdido para sempre, irrevogável. Estampava a dor que nos ia pela alma. Dor sem remédio que só o tempo faria diminuir. Ainda hoje, ao rever a foto, ainda hoje dói. Aquela fotografia deixou marcado em quem viveu ao tempo da chamada “Tragédia de Sarriá” um momento inesquecível de união nacional.
Eu era estudante em São Paulo e desde logo passei a ler o “Jornal da Tarde”. O diário se distinguia dos outros jornais pela leveza e dinamismo de um jornalismo jovem e aguerrido. De leitura mais rápida e fácil, preenchia muito bem as necessidades de quem não dispunha, durante a semana, de tempo para a demorada leitura de outros jornais.
Hoje foi enterrado o Dr. Rui Mesquita que sempre esteve à frente do “Jornal da Tarde”. Tinha ele 88 anos de idade e recebeu justíssimas homenagens de pessoas que privaram de seu convívio. Muitos foram os que o homenagearam comentando o perfil de luta e seriedade que o caracterizaram.
Fica aqui a homenagem de um leitor desconhecido que acompanhou de longe a trajetória do Dr. Rui e lhe é grato pelo excelente jornalismo que tantas lacunas preencheu no dia-a-dia dos brasileiros. Jornalismo de excelência como aquele praticado no dia seguinte à derrota do Brasil no jogo com a Itália em 1982.