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O Maranhão
Com tristeza se leem notícias sobre o que se passa no Maranhão. Então a querida São Luís encontra-se sob o terror da insegurança e a população tem medo de sair às ruas? E isso debaixo daquele maravilhoso sol e diante de tanta formosura? Rapaz…
São Luís foi a penúltima capital brasileira que tive o prazer de conhecer. Faltavam-me justamente a capital maranhense e Manaus que ainda não conheço. São Luís realmente me surpreendeu. O acolhimento dos maranhenses, as belezas naturais, o centro antigo com os casarões de paredes ornadas com azulejos moldando desenhos inesquecíveis, o por do sol, as praias, a comida… Rapaz, aquilo é bom demais.
Terra hospitaleira o Maranhão, com suas peculiaridades. Ali se come um peixe preparado de modo que a meu ver dificilmente se encontra em outras partes do Brasil. Preparação e temperos próprios maranhenses conferem às peixadas sabores extasiantes que desafiam o paladar. E que dizer daquela praia na qual se entra com o carro, estacionando-se na própria barraca enquanto a maré não sobe? Soube que dias atrás os banhistas foram surpreendidos pela rapidez da alta da maré e muitos carros foram atingidos pelas águas do mar. Em vão tentaram socorrer-se nos bancos de areia, mas a rapidez da movimentação das águas apanhou-os.
Pois não se conhece bem o Maranhão se não se visitar Alcântara. Olhe que é bom ter estômago resistente a enjoo, porque a travessia de barco de São Luís a Alcântara se faz sob as vontades do mar que se agita sem avisar. Mas, chegando a Alcântara quanta beleza. De repente você se pega andando em ruas do passado, cercadas de prédios antigos. Belos e interessantes os museus de Alcântara, a natureza que se plasma com a visão belíssima do mar.
Inesquecíveis mesmo são os Lençóis Maranhenses jogo tramado entre areias e água que parece ter sido inventado por pura diversão do Criador. Terá Ele numa tarde de fastio imaginado criar algo diferente de tudo que existe na Terra, algo mutável onde qualquer teoria sobre a eternidade das coisas fosse colocado em cheque. Nos Lençóis a vida se mostra pequena diante da grandiosidade de algo que nunca termina porque se está sempre de cara com o começo. Vigora nesse labirinto de estranhas igualdades a magia das dessemelhanças numa paisagem que jamais se mostra igual. Caso estranho e único na Terra, daí que tanta gente de várias partes do mundo se aventure naqueles extremos onde o Sol impera e as areias lutam para encobrir as águas numa batalha sem solução. Depois, o por do Sol, festival de cores que douram e trazem maravilhas para os olhos dos homens cada vez mais apequenados diante de tamanha grandiosidade.
Eu ficaria falando sobre o Maranhão, mas paro. Na verdade protesto contra as administrações que permitem desmandos a ponto de tornar aquela terra fonte de horríveis noticias nas colunas policiais. Aí está o Maranhão encolhido aos olhos da opinião, transformado em terra de ninguém, sucumbindo ao crime organizado. Aí estão os tristes acontecimentos no presídio de Pedrinhas, arranhando a imagem de um Estado que a essa altura deve se envergonhar das pessoas que o administram.
Mas, isso vai passar porque o Maranhão é maior - muito maior - que tudo o que agora lá acontece.
O pior pastel do mundo
Desde menino sou fissurado em pastéis. Na cidade do interior em que morava a minha avó, um chinês abriu pastelaria e logo conquistou muita freguesia. Eu simplesmente adorava os pastéis do chinês. Qualquer dinheiro que caia no meu bolso tinha destino certo: comprar um pastel de carne no chinês. Mas, essa bela história não teve final feliz porque, depois de algum tempo, verificou-se uma diminuição do número de gatos na região onde ficava a pastelaria. Certo dia fui à pastelaria e a encontrei fechada. Fechada não, lacrada. Só então descobri que andara comendo carne de gatos utilizada pelo dono na produção dos seus pastéis.
Mas, o pastel do chinês não era o pior do mundo. Que fiquem claras as condições necessárias para a escolha do pior: é preciso alguém estar com muita fome, gana por um pastel e encontrar um deles que não seja possível comer.
Aconteceu comigo dias atrás experiência terrível. Não sei se você alguma vez fez o trajeto entre São Luís do Maranhão e a cidade de Barreirinhas. Isso mesmo, a Barreirinhas onde ficam os famosos, os maravilhosos, Lençóis Maranhenses. Para quem não sabe o percurso entre as duas cidades é de cerca de 300 km e a viagem se faz por ônibus ou vãs - há também a possibilidade da via aérea em aviões monomotores.
Peguei o ônibus às seis horas da manhã na Estação Rodoviária de São Luís. O que não esperava era a morosidade do ônibus que gastou quatro horas e meia para fazer o percurso. Não é o caso de demorar-me aqui sobre a triste paisagem que pude ver através da janelinha do veículo. A pobreza no interior do Maranhão é agressiva, terrível, dessas que nos acossam a ter remorso até pelo pouco que carregamos no bolso. São brasileiros, famílias inteiras, vivendo em condições para lá de precárias. Situação triste que revela o outro lado de um país no qual impera a desigualdade e o descaso de governos que, ainda assim, se rejubilam pelos seus “memoráveis” feitos.
Bem, a meia viagem o ônibus parou num lugar para que os passageiros pudessem comer alguma coisa, usar banheiro etc. Foi quando se formou fila com pessoas pedindo o único salgado disponível no lugar: o pastel. Ora, justamente o pastel. Vi que as pessoas pediam, pagavam e saiam comendo seus pastéis - fazendo boa cara, diga-se. Diante disso me animei: estava com fome e adoro pastéis. O problema se deu na primeira mordida: o pastel era intolerável, intragável, “in” o que quer que seja como prefixo de palavra que designe qualquer coisa muito ruim. De fato aquele pastel era de uma ruindade ultrajante a começar pela massa grosa, espessa, mole, desfazendo-se. Frio, muito frio. Não me atrevo a falar alguma coisa sobre o conteúdo escondido sob a malfadada massa.
Confesso que não consegui engolir aquilo. Fora do bar cuspi o que tinha na boca e dei um jeito de me livrar do restante do pastel. Não houve como não maldizer a hora em que me deixei levar pelo impulso de comprar o pastel. Fiz o resto da viagem com o estômago embrulhado. Agora, passados alguns dias, fico pensando na genialidade gastronômica da(o) chefe de cozinha do bar. Genialidade às avessas que logrou produzir, talvez, senão o pior pastel do mundo, forte candidato ao título.
Se você algum dia for de ônibus a Barreirinhas, cidade ótima, aconselho não se arriscar ao pastel que está a venda no caminho.