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Sem água
Espero com preocupação o racionamento de água. O tal 5 X 2 é assustador. Li sobre o repórter que se impôs o regime de racionamento a título de experiência. Banho com regador! Que dizer dos utensílios sujos, das descargas, etc? Rapaz…
Na década de 90 do século passado m internei no sertão da Bahia, rumando em direção a Canudos. Passei quase 20 dias na região, visitando lugarejos e cidadezinhas. Vi de perto - na verdade na pele - a seca e seus efeitos. Seguindo pela caatinga, sob sol inclemente e pisando solo seco, esturricado, compreendi o que é viver naquelas paragens desoladoras. Na época não existiam as estradas que hoje cortam a região. Queimadas, Bom Conselho, Massacará, Euclides da Cunha e o sertão inóspito com seus mandacarus, barrigudas e toda sorte de cactáceas!
No sertão ousei compreender porque tanta gente se desloca para os grandes centros do país em busca de vida melhor. Nada pode ser pior que a carestia dos lugares onde vivem, assim me explicou um caiçara a falta do irmão que viera se arriscar em São Paulo.
Daquilo tudo ficou a falta de água. Povoados onde vez ou outra um caminhão pipa da prefeitura aparece para socorrer os necessitados. Gente carregando vasilhas enormes, percorrendo longas distâncias para trazer para casa uma merreca do preciso líquido. Os banhos impossíveis. As marcas de pés no chão que não se apagam porque não chove.
Quando voltei do sertão tive dificuldades em relação ao consumo de água. Sentia-me culpado toda vez que abria a torneira. Parecia-me injusto usar e abusar do líquido enquanto tantos brasileiros não dispunham dele. Briguei com a turma de casa para que economizassem água.
Desde aquela época trato a água como um bem a ser preservado. Nunca mais tomei banhos prolongados e sempre cuidei de evitar exageros com torneiras abertas. Posso dizer que aprendi a regra do sertão.
Agora a seca bate à nossa porta. Vejo com preocupação pessoas alheias ao perigo que correm, descuidando-se da economia de água. Talvez valesse a pena homologar uma lei, punindo quem não economize água. A pena seria, por exemplo, passar dez dias no sertão, bem no meio da caatinga. Tenho certeza de que as pessoas voltariam mudadas de lá, certificadas de que a água é um bem comum e que com mau uso dela corre-se o risco de esgotá-la.