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Trânsito em São Paulo

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Afirma-se que a complexidade das coisas é proporcional aos tamanhos das engrenagens que as sustentam. Não sei se isso se aplica às populações humanas. De todo modo cidades grandes e que continuam crescendo parecem gerar problemas proporcionais ao seu tamanho. São Paulo, infelizmente, é um exemplo desse fato.

Lembro-me bem daquela São Paulo do final dos anos 50. Era já uma metrópole, mas bem menos agitada que nos dias atuais. Na década de 60 o trânsito na Rua Vergueiro em direção aos bairros do Paraíso e Vila Mariana era terrível nos horários de pico. A Av 23 de Maio, inaugurada nos anos 70, ajudaria a desafogar as ruas centrais dividindo com elas o tráfego em direção aos bairros - tomei muitos ônibus e bondes na Praça da Liberdade, seguindo em direção à Vila Mariana onde morava.

Tenho um parente que a todo custo quer se mudar de São Paulo. Ele diz que simplesmente não aguenta mais. Perde duas horas em seu carro para ir da casa dele ao escritório e mais de duas para voltar. Para a distância que percorre entre os dois pontos seriam necessários no máximo 20 minutos caso o trânsito fluísse normalmente. Além do que de tempos para cá o parente anda assustado: esteve em meio a um tiroteio entre bandidos e um motorista de carro que reagiu à tentativa de assalto. Com mulher e filho pequeno dentro do carro o parente chegou a pensar que talvez não saíssem vivos da inusitada situação em que se encontravam.

O problema dos paulistanos é a ausência de perspectivas de melhoras em curto e longo prazo. Para manter a economia em alta o atual governo estimulou o crédito e o comércio de carros. Resultou desse fato crescimento significativo da frota de veículos que entopem as ruas da cidade. Agora o novo prefeito decide estimular o transporte público, criando faixas exclusivas para os ônibus. A medida é interessante, mas reduz dramaticamente a área de circulação dos demais veículos. Na cidade habitualmente congestionada ocorre a congestão do trânsito. As pessoas simplesmente não podem optar pelo transporte público porque ele é deficiente e não atende todas as regiões que dele necessitam. O metrô é pequeno demais para uma cidade tão grande. Resta aos proprietários de veículos a utilização deles para ir e voltar ao trabalho.

O imbróglio atualmente existente em São Paulo dá o que pensar. Como resolvê-lo? No passado alguns diretores de trânsito conseguiram amenizar os problemas de suas épocas adotando medidas inteligentes. Hoje, talvez, nenhuma inteligência seja suficiente para dar conta de um número excessivo de veículos, motos, bicicletas, faixas exclusivas, transporte urbano precário e metrô com capacidade inferior às necessidades da população.

O prefeito diz que as pessoas terão que desistir dos carros e apelar para o transporte público. Seria bom caso fosse simples. O que não dá é para ficar horas preso dentro de veículos, esperando que um milagre aconteça para desatar os nós do trânsito.

Mas, não é por isso tudo que deixaremos de amar a nossa querida São Paulo.

Onda de protestos

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O difícil é saber de que lado se está nessa onda de protestos que açoita o povo nas ruas de São Paulo. Se observarmos bem o noticiário veremos que o desenrolar dos acontecimentos se traduz numa troca de acusações sobre o estopim da violência. Ora se diz que em meio à massa de pessoas que protestam existem baderneiros infiltrados com a única intenção de agredir e depredar; outros acusam a polícia de atacar manifestantes e iniciar a batalha que se trava nas ruas. Pedras, bombas de efeito moral, balas de borracha, paus, fogo e outros apetrechos fazem parte do arsenal de luta do qual até agora, por pura sorte, não foram verificadas perdas de vida.

Há muitos anos fui surpreendido por uma manifestação popular nas ruas de Buenos Aires. A minha surpresa se explica porque a marcha acontecia não muito tempo depois da queda dos regimes autoritários. Gravei na retina as faces das pessoas que iam à frente da marcha, homens de paletó e gravata, mulheres bem alinhadas, braços dados, seguidos por uma multidão silenciosa. O máximo a que se deram direito foi o de distribuir folhetos nos quais se explicitava a razão de seu protesto. Nada a ver com os panelaços que mais tarde se tornariam célebres em Buenos Aires.

No atual caso que acontece em São Paulo fica difícil tomar-se um lado. Condena-se a depredação e o vandalismo que nada têm a ver com o protesto contra a elevação das tarifas dos ônibus. Por outro lado não se podem apoiar ações desmedidas de repressão que tantas vezes pecam por indiscriminadas, atingindo até mesmo transeuntes que nada têm a ver com a ação que se desenvolve ao seu redor.

A essa altura dos acontecimentos nem adianta rogar para que o bom-senso prevaleça. Os manifestantes já marcam mais uma rodada e o governo avisa que não tolerará agressões e vandalismo.

As manifestações em São Paulo ilustram bem o modo como coisas aparentemente simples podem sair de controle e transformar-se num impasse de difícil solução. Elas refletem a insatisfação represada que parece encontrar válvula de escape na elevação das tarifas de ônibus urbanos. É preciso atentar para as razões mais profundas do que ora acontece para esta não seja apenas a primeira de uma série de protestos de um povo cansado de tanta impunidade e manobras políticas e econômicas que não visam o bem-estar comum.